Miguel Alvarenga – Com a morte de Maria João Quadros, ontem, dia de Nossa Senhora da Conceição, com 73 anos, cinco meses depois de ter sido operada a um cancro no pâncreas, morre também um pouco do Fado antigo, morrem recantos com história de uma Lisboa que não volta, morre todo aquele encanto que ela irradiava naquela voz meio rouca e tão castiça, risos de simpatia e charme entre um cigarro e um uísque – e muito Fado.
A Maria João não era só uma Mulher giríssima que marcou Lisboa e o Fado, com uma maneira tão própria e tão única de estar na vida, uma mãe e avó babadíssima e extremosa. Era um furacão. Onde ela estivesse, a vida tinha um sentido especial, diferente, único. Falava, ria, vivia com uma alegria intensa. E cantava, cantava. Às vezes, até ser dia.
Conhecia-a nos anos quentes da revolução, nesse final conturbado da década de 70, no seu «Desassossego», um cantinho onde se cantava o Fado ali chegado ao «Stones», onde iam todos no final da noite. Passavam tantos por lá. O Fado passou por lá. O Nuno da Câmara Pereira nos seus inícios, o Jorge Fernando, o João Mário Veiga, o meu querido Pedrinho da Veiga, o Bernardo Mesquitella, o António Pinto Basto, todos. Eram noites que nunca acabavam.
Depois e ao longo dos muitos anos que se seguiram, fomos cruzando os nossos caminhos em tantas ocasiões. Na sua «Casa da Mariquinhas», na «Taberna da Saudade», nas várias vezes em que cantou nos restaurantes do meu irmão Nuno. E em 2016 cantámos outra vez juntos no Fontana Park Hotel, em Lisboa, no Jantar de Natal do International Club of Portugal. Com o António Pinto Basto.
A escritora Rita Ferro, que era prima da Maria João (nascida em Moçambique), recordou hoje nas redes sociais que ela «era fado da cabeça aos pés. De corpo, alma, coração e espírito». Toda a gente lhe chamava Feijão.
A Maria João foi operada em Julho a um tumor no pâncreas. Em Outubro esteve no programa «Casa Feliz» da SIC e dissse estar «óptima». «A palavra cancro horroriza-me», confessou.
«Era incapaz de maldade. Tinha graça, charme, vida e optimismo para dar e vender. Nunca se queixava, era encantadora. Fará falta à vida» – disse Rita Ferro.
Muita falta, mesmo.
As minhas mais sentidas condolências a toda a Família enlutada. À Isabel, sua irmã, a sua filha, netos e netas.
Descanse em paz, Maria João.
Fotos D.R.
Pinto Basto, Miguel Alvarenga, Yolanda Soares, Fernando Pereira,
Maria João Quadros e Yuqi Sun
Com José Pracana e João Ferreira Rosa. A esta hora, já há
certamente grande fadistagem no Céu!
Leer máshttp://farpasblogue.blogspot.com/